Promovendo o desenvolvimento social no Peru: Aportes da evidência científica

Esta entrevista faz parte da iniciativa “Vozes Ressoantes: Ouvindo as Vozes dos Usuários de Evidências na Região da América Latina e Caribe”. O projeto é um esforço colaborativo com o Hub LAC atuando como implementador e a Overton como financiadora. Nesta entrevista, conversamos com José Enrique Velasquez do Peru.

José Enrique Velasquez é Médico, possui mestrado em Saúde Pública e em Epidemiologia Clínica. Atualmente, atua como professor universitário na Universidade Peruana Cayetano Heredia e como Diretor Geral de Acompanhamento e Avaliação do Ministério de Desenvolvimento e Inclusão Social (MIDIS) no Peru.

No final de 2022, o MIDIS aprovou a atualização da Política Nacional de Desenvolvimento e Inclusão Social, uma política que reúne 14 setores e identifica 81 serviços. Esta política tem dezenove diretrizes e cinco objetivos prioritários. A Direção de Acompanhamento e Avaliação está atualmente trabalhando em três temas prioritários, nos quais acreditamos que a disponibilidade de evidências é crítica.

O primeiro deles está relacionado à Segurança Alimentar. Hoje estamos trabalhando com maior intensidade nas intervenções mais eficazes para melhorar a segurança alimentar, especialmente para a população pobre e vulnerável.

O segundo tema está relacionado com a pobreza. Estamos em transição de um enfoque unicamente monetário da pobreza para uma medição multidimensional complementar, não apenas pelo trabalho próprio do MIDIS, mas porque acreditamos que a complementação de ambas as medições pode nos proporcionar uma melhor percepção da pobreza na população.

E o terceiro tema está relacionado com os anteriores: é a anemia infantil. Existe a necessidade de melhorar os resultados da anemia em crianças menores de três anos, que é a população na qual focamos nossa atenção, especialmente em menores de 12 meses, pois é o período em que há uma formação intensa das conexões neuronais e onde a porcentagem de crianças com este problema é mais alta.

A evidência científica desempenha um papel fundamental na tomada de decisões, sendo sua aplicação crucial para o setor. Um exemplo recente é o programa de transferência condicionada na primeira infância.

Durante a pandemia, havia uma dúvida sobre como o fechamento dos serviços e a ausência de visitas domiciliares impactariam a população infantil imediatamente após o nascimento.

Realizamos uma busca intensa por evidências internacionais, pois não tínhamos evidências nacionais suficientes para identificar se era esperável obter resultados importantes no desenvolvimento da primeira infância com um programa de transferência condicionada. Encontramos todo tipo de evidências, categorizamos e fizemos uma matriz de evidências.

Graças a essa iniciativa, implementamos um piloto inovador mediante a adaptação de um programa existente chamado “Juntos”. Ampliamos a assistência a gestantes e mães de recém-nascidos e a captação oportuna delas. Foram adicionados serviços como triagem para anemia, suplementação com ferro e acesso à vacinação, coordenados com o Ministério da Saúde. Cumprindo com essas responsabilidades mínimas, era concedida uma transferência ao lar de maneira imediata, complementar à transferência base que alguns desses lares já vinham recebendo.

A evidência respaldou o desenho e a implementação do piloto do programa, facilitando o apoio do Ministério da Economia e Finanças e a posterior aprovação por decreto de urgência do Ministério de Desenvolvimento e Inclusão Social.

Após um ano de implementação, complementamos as evidências iniciais com novos dados, incluindo uma avaliação sobre desnutrição e acesso a serviços para a primeira infância. Esses resultados, juntamente com as evidências internacionais e próprias geradas, respaldaram a proposta de extensão e escalonamento do programa a nível nacional, nos setores rural e urbano.

Para esse trabalho, recebemos o apoio do Banco Interamericano de Desenvolvimento, do Banco Mundial, de um especialista em transferências condicionadas e de instituições acadêmicas.

Barreiras

A temporalidade entre a decisão política que precisa ser tomada e o trabalho técnico necessário para reunir a melhor evidência disponível. A demanda por evidências para tomar essas decisões políticas pode ser de até uma semana, enquanto que, do ponto de vista técnico, podemos estar falando de um trabalho de meses para fornecer essa evidência.

A segunda barreira está relacionada com o orçamento. Gostaríamos de ter orçamento suficiente para realizar todas as avaliações e todos os estudos necessários para gerar evidências próprias, mas os recursos são geralmente limitados e insuficientes.

A terceira barreira que eu gostaria de mencionar é o acesso a fontes e recursos de informação de qualidade, e isso está relacionado ao acesso a buscadores. Embora haja um maior investimento na democratização da evidência, ainda temos dificuldades para acessar determinados tipos de evidência.

Um quarto ponto que gostaria de destacar como barreira é a necessidade de trabalhar constantemente para manter uma cultura de evidência a nível institucional, uma que facilite as alianças com outras instituições dentro do país, não apenas com a academia, mas também com diferentes organizações do setor público e privado.

Finalmente, um desafio que enfrentamos é conseguir levar a evidência e disponibilizá-la para os diferentes públicos-alvo e fazer com que eles entendam o real alcance da evidência. Isso significa traduzir o conhecimento para os diferentes públicos.

Facilitadores

Uma vez que se usa a evidência para tomar decisões, pode-se gerar, se mantido um contexto propício, um efeito de bola de neve. Assim, a partir de algo pequeno, pode-se fazer algo cada vez maior e gerar uma cultura mínima de tomada de decisões sempre respaldadas na melhor evidência disponível, e isso é algo que deve ser destacado e reforçado.

Obtivemos resultados destacados ao compartilhar nossas evidências no portal Evidência MIDIS e ao envolver pesquisadores internacionais em outros espaços. Essas colaborações nos permitiram acessar novas evidências internacionais, fortalecendo nossas avaliações e resultados. Identificar e aproveitar oportunidades semelhantes pode conduzir a mais resultados positivos.

O tomador de decisões precisa entender que suas decisões terão um maior respaldo e um melhor resultado (que também pode ser medido politicamente) na medida em que estiverem apoiadas em evidências. Os tomadores de decisão estão sujeitos a julgamentos, questionamentos e controle interno pelas decisões que tomam, mas isso pode ser claramente resolvido de forma satisfatória se as decisões forem baseadas em evidências.

Eles também podem projetar uma imagem diferente para os meios de comunicação, o que os posiciona de uma maneira distinta.

As necessidades do tomador de decisões na esfera política podem diferir das da academia. Portanto, para que os pesquisadores consigam que os tomadores de decisões utilizem a evidência, é crucial identificar as necessidades no âmbito político.

Os pesquisadores, especialmente na academia, precisam entender que o político precisa tomar decisões rápidas.

Por último, uma vez reunida a melhor evidência disponível, é fundamental disponibilizá-la em espaços de divulgação e reflexão, quando apropriado e com as pessoas adequadas.


Contato do entrevistado: jvelasquez@midis.gob.pe

Uso de evidências para fortalecer a atenção à Saúde na Colômbia

Esta entrevista faz parte da iniciativa “Resonating Voices: Ouvindo as Vozes dos Usuários de Evidências na Região da América Latina e Caribe”. O projeto é um esforço colaborativo com o Hub LAC atuando como implementador e a Overton como financiadora. Nesta conversa, o Hub LAC dialoga com John Edison, da Colômbia.

John Edison é Administrador de Saúde e Advogado, com Mestrado em Epidemiologia. Atualmente, ele atua como Assessor do Vice-Ministro de Proteção Social no Ministério da Saúde e Proteção Social da Colômbia.


A sustentabilidade financeira do sistema de saúde é uma questão urgente na qual temos trabalhado. Em particular, problemas relacionados à produção de novas tecnologias de saúde. Isso tem sido um problema recorrente não apenas no nosso sistema, mas em todo o mundo, pois levou a um rápido aumento nos custos nos últimos anos, causando preocupações significativas sobre os recursos.

Outra questão está relacionada à implementação de redes de serviços abrangentes e integradas e estratégias de atenção primária à saúde, envolvendo especialmente o nível primário de atendimento.

Por fim, a principal atividade que estou apoiando é atualmente o projeto de reforma do Sistema Geral de Segurança Social. É um projeto de reforma explicitamente liderado por este Vice-Ministério. Estamos gerando tudo relacionado à proposta deste projeto e todo o progresso sendo atualmente feito no Congresso da República.

A evidência é crucial. A maioria de nós envolvidos nesse processo de reforma vem do meio acadêmico, e cada decisão e artigo sendo trabalhados e acordados são baseados na melhor evidência disponível.

Em relação às estratégias de atenção primária, especificamente no que diz respeito às equipes básicas de saúde e à redução dos gastos com saúde, diferentes departamentos do Ministério têm conduzido revisões de literatura. Especificamente, o departamento de Promoção e Prevenção (PYP) tem realizado exercícios focados em definir quais profissionais devem compor essas equipes básicas de saúde e estimar os gastos com essas estratégias, com base no que foi feito em outros sistemas de saúde. Da mesma forma, as revisões de literatura têm se concentrado nas atividades que poderiam ser realizadas em termos de cuidado extramural.

Também criamos espaços de trabalho colaborativos para definir questões na estrutura PICO (Paciente, Intervenção, Comparação e Resultado) e conduzir uma revisão da literatura. Particularmente, um mapa de evidências foi criado com o apoio da BIREME (Centro Latino-Americano e do Caribe de Informação em Ciências da Saúde) e da OPS. Isso levou a uma síntese de evidências que orientou a estimativa de gastos mencionada para as equipes de APS (Atenção Primária à Saúde) e agora é usada como suporte para justificar a maioria dos pedidos feitos por senadores, congressistas e a sociedade civil, que exigem esse tipo de evidência.

Em relação às parcerias, temos acordos com universidades como a Universidade de Antioquia, a Universidade Nacional, a Universidade dos Andes e a Universidade Javeriana.

Existem outros tipos de acordos de governos anteriores, como o acordo com a Health Metrics para realizar estudos sobre a carga econômica das doenças.

Em termos de cooperação internacional, novamente, temos acordos com a OPS, USAID (Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional), OIM (Organização Internacional para as Migrações) e a Agência Francesa de Desenvolvimento, entre outros, que incluem centros de pesquisa e instituições geradoras de evidências.

Barreiras:

A principal barreira é o tempo. Frequentemente, recebemos solicitações de evidências em um curto período, durante o qual devemos reunir as melhores evidências disponíveis e apoiar uma decisão que já foi tomada ou está prestes a ser tomada.

Outra barreira é a falta de treinamento ou educação contínua em termos de novas técnicas e estratégias de pesquisa.

A definição de competências e o manual de funções também podem se tornar uma barreira, pois, às vezes, os tempos ou o perfil específico para a realização de atividades relacionadas à produção e uso de evidências não estão definidos.

A estrutura atual do sistema, criada há mais de 30 anos, talvez não tenha sido planejada particularmente com a necessidade urgente e imediata de incluir grupos geradores de evidências dentro das instituições públicas. Isso tem levado muitas instituições a passarem por transformações.

Por fim, os recursos econômicos disponíveis para cada entidade podem ser uma barreira. Os orçamentos são planejados para funções específicas e, raramente, incluem funções específicas para questões como a revisão de evidências. Não há um orçamento explícito para isso, nem pessoas dedicadas exclusivamente a essa função.

Facilitadores:

O dinamismo e a modernização do Estado, onde buscamos revisar bem essas funções e esperamos que possam haver funções específicas para apoiar o uso de evidências. Quando as instituições têm acesso às melhores evidências disponíveis, elas se transformam.

O apoio de organizações de cooperação internacional, acordos desenvolvidos com centros de estudos, centros de pesquisa e instituições dedicadas a trabalhar com evidências.

A precisão das evidências é um facilitador muito importante, pois todo ato administrativo está sujeito ao escrutínio público. Nesse sentido, as evidências são um mecanismo de apoio e defesa muito importante que temos contra os órgãos de fiscalização.

A facilidade de acesso às evidências também é um facilitador importante. A literatura científica é mais acessível do que há alguns anos.

Outro facilitador é que atualmente temos o Ministério da Ciência, que também faz parte dos órgãos de tomada de decisão.

Por fim, graças aos acordos com universidades e programas acadêmicos, foram criadas oportunidades para que certos funcionários recebam treinamento, gerando benefícios em termos de capacitação.

Para os pesquisadores, o conselho é estar muito consciente da realidade política do sistema. Diferentes temas de pesquisa surgem daí para orientar a tomada de decisões. Frequentemente, os pesquisadores se concentram apenas no contexto que podem discernir nos centros de estudo e raramente conhecem a realidade política e contextual do sistema como um todo. Se conseguirmos inserir a academia nesses cenários políticos, acredito que uma sinergia importante pode ser gerada.

E para os envolvidos na tomada de decisões, o principal conselho que eu daria é que, em termos práticos, as evidências reduzem a incerteza das decisões, e isso pode contribuir para gerar políticas públicas precisas que se adequem à realidade da população. Sempre temos órgãos de fiscalização observando e prestando atenção às decisões que tomamos, e as evidências se tornam um mecanismo probatório para defender a decisão tomada. Tudo isso ajuda a garantir que o sucesso de qualquer decisão possa se traduzir melhor no âmbito da política pública.


Contato do entrevistado: edison.betancur@udea.edu.co

Dayana Brunetto - Coordenadora Geral de Promoção dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+

Conquistas e desafios da produção e uso de evidências para a promoção dos direitos das pessoas LGBTQIA+ no Brasil

Esta entrevista faz parte do projeto ‘Resonating voices: Escutando as vozes das/os usuárias/os de evidências na região da América Latina e Caribe (LAC)’. Este projeto é realizado graças à colaboração entre o Hub LAC, como executor, e a Overton, como financiador. Nesta conversa, o Hub LAC fala com Dayana Brunetto do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania do Brasil. 

Dayana Brunetto é professora, pesquisadora e ativista com mestrado, doutorado e pós-doutorado em educação pela UFPR. Faz parte do Comitê Científico da ANPED – Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação. Atualmente, é Coordenadora Geral de Promoção dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+ no Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania do Brasil.

Trabalhar na nova Secretaria Nacional dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+ tem sido uma experiência desafiadora e gratificante ao mesmo tempo. É a primeira secretaria nacional dos direitos das pessoas LGBTQIA+ no mundo. Então ela está muito em foco, tanto como alvo dos ataques do conservadorismo, quanto como referência para outros países e lugares do mundo, por ser a primeira estrutura em segundo escalão de governo para cuidar dessas políticas, das pessoas e promover a transformação de suas vidas. 

Na nossa secretaria, enfrentamos uma série de questões prioritárias que impactam diretamente nosso trabalho, nossos objetivos e principalmente a vida das pessoas LGBTQIA+. Uma delas é a ausência ou a insuficiência e instabilidade dos dados disponíveis. Apesar dos dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE abordarem a orientação sexual, geralmente quem responde é a pessoa responsável pelo domicílio daquela família. Então, caso seja um pai, uma mãe ou responsável lesbofóbica/o, por exemplo, eles não vão falar que a filha é lésbica, corroborando para uma subnotificação desses dados. 

Outro problema prioritário é o enfrentamento dos efeitos do poder do discurso de ódio na sociedade, especialmente em relação às pessoas LGBTQIA+. A disseminação do factóide “ideologia de gênero” tem prejudicado a abordagem de gênero por professoras e professores, pesquisadoras e pesquisadores, levando à desvalorização das pesquisas e à perseguição de profissionais da área, além de incentivar as violências e a violação de direitos. A “ideologia de gênero” é um discurso mentiroso e criminoso, porque promete proteger as crianças, mas, na verdade protege o estuprador. Uma vez que a escola pode ser o único espaço com o qual a criança pode contar para denunciar as violências sexuais que sofre em casa. Quando você tira as discussões sobre gênero e sexualidade numa perspectiva de Direitos Humanos  da escola, retira também a possibilidade de algum apoio a criança e adolescente vítima de violência sexual.

Um dos nossos principais esforços é a produção de dados estáveis e confiáveis. Logo, elaboramos um formulário padrão, com questões mínimas e alternativas padronizadas para a coleta de dados sobre pessoas LGBTQIA+. Este formulário foi referendado pelo Conselho Nacional dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+ e pode ser utilizado por órgãos públicos e por pesquisadoras/es e institutos para coletar informações relevantes sobre esses grupos. Estamos trabalhando em uma nota técnica, com um parecer, a ser encaminhada para todos os órgãos públicos que coletam dados, com as questões, para que haja implementação. No entanto, ainda encontramos obstáculos institucionais e por vezes resistência por parte daqueles que não compartilham dos nossos objetivos e da valorização dos direitos humanos de todas as pessoas.

Nesse processo, buscamos diferentes fontes de informações e evidências científicas para embasar nossas decisões. Também temos um trabalho muito interligado com o Observatório Nacional dos Direitos Humanos – ObservaDH e com a ReneDH – Rede Nacional de Evidências em Direitos Humanos, instâncias do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania – MDHC. Uma das abordagens que temos adotado é trabalhar em parceria com consultorias especializadas. Acreditamos que essas parcerias podem preencher lacunas importantes e nos fornecer insights valiosos. 

Um exemplo significativo de pesquisas realizadas por movimentos sociais organizados é o I LesboCenso Nacional, uma pesquisa ativista-acadêmica fundamental para estabelecer uma agenda governamental concreta, culminando na criação da Agenda Nacional de Enfrentamento à Lesbofobia e ao Lesbo-ódio. Uma parceria interministerial em conjunto com o Ministério da Igualdade Racial, Ministério das Mulheres e com o Ministério dos Povos Indígenas. 

Com 21.050 respostas em todo o país, o censo revelou dados impactantes, indicando que oito em cada dez lésbicas no Brasil já sofreram lesbofobia, por exemplo. Além disso, aproximadamente 7 em cada 10 já foram estupradas, com ou sem penetração. Esses resultados têm impulsionado debates e ações em áreas como saúde, educação, segurança pública, assistência social e cultura. A fase em andamento envolve entrevistas para aprofundar os dados quantitativos. Na última fase da pesquisa será realizada formação política para promover políticas públicas informadas por evidências.

Instituímos também o Conselho Nacional dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+, com 38 representações, sendo 19 dos movimentos sociais e 19 governamentais. Acreditamos que a política pública precisa da participação social de quem está no território na produção das evidências. Portanto, estabelecemos um diálogo contínuo entre os movimentos sociais e o governo, garantindo que as políticas propostas sejam assertivas, viáveis e eficazes. 

Barreiras

Uma das principais barreiras que enfrentamos são os efeitos do discurso de ódio na sociedade. Esse discurso permeia diversos espaços, incluindo a gestão pública, a universidade e a escola, tornando mais difícil a implementação de políticas informadas em evidências nesta área. Essa realidade é especialmente dolorosa para quem trabalha com direitos humanos, pois confrontamos diariamente a negação do direito à igualdade e ao respeito à dignidade humana de todas as pessoas. 

Outro desafio significativo é o orçamento restrito, que impacta não apenas a obtenção de evidências, mas todas as nossas atividades. No entanto, mesmo com recursos limitados, buscamos realizar formações, iniciativas e pactuações que promovam o enfrentamento às violências contra as pessoas LGBTQIA+ e outras formas de discriminação, bem como promovam a valorização dos direitos humanos dessas pessoas.

A pactuação para a produção de dados também acaba sendo uma barreira, pois ainda temos muita confusão com os principais conceitos que sistematizam minimamente as nossas subjetividades, como sujeitas/es/os LGBTQIA+, além de que a nossa pauta não é consensual por uma frente ampla de atrizes e atores políticos. Logo, essa confusão teórica, epistemológica e política, soma-se à questão do conservadorismo, do moralismo e dos efeitos de poder dos discursos de ódio nas realidades territoriais, o que acaba dificultando a coleta de dados e, consequentemente, a produção das evidências e das análises..

Facilitadores

Apesar dessas barreiras, reconheço que existem oportunidades para avançar nesse processo. Uma delas é o fortalecimento das parcerias com movimentos sociais, academia e organismos internacionais, que pode fornecer apoio e expertise na produção e utilização de evidências. Além disso, acreditamos que devemos buscar alternativas criativas para institucionalizar práticas informadas em evidências, mesmo diante da falta de apoio legislativo.

Ainda há muito trabalho a ser feito para superar essas barreiras e garantir que nossas políticas sejam informadas por evidências sólidas e direcionadas às necessidades reais da população. Acreditamos que, com uma abordagem colaborativa e informada por evidências, podemos fazer progressos significativos na promoção, proteção e defesa dos direitos e no enfrentamento das violências, violações de direitos e desigualdades.

Em relação às/aos pesquisadoras/es é importante que estabeleçam um diálogo efetivo com as pessoas e comunidades afetadas pelo tema de pesquisa, mesmo que não sejam necessariamente parte desse grupo. Não é preciso ser um sujeito específico para pesquisar sobre determinado assunto, mas é essencial ouvir e compreender as experiências e perspectivas das pessoas envolvidas. As/Os pesquisadoras/es precisam estar abertas/os e receptivas/os às mudanças e movimentos da sociedade, adaptando-se e aprendendo com essas transformações contínuas.

Também existe a necessidade de colaboração entre pesquisadoras/es e tomadoras/es de decisão em todos os níveis, desde o federal até os níveis locais, para garantir que as políticas e decisões sejam informadas por evidências robustas e relevantes.

Já para as/os tomadoras/es de decisão, é preciso que se tenha um compromisso ético-político de oferecer serviços públicos de qualidade e um atendimento ético para todas as pessoas. Isso precisa acontecer pela via do profissionalismo, independentemente das crenças pessoais das/os tomadoras/es de decisão. Além disso, é importante a formação adequada das/os profissionais envolvidas/os em políticas públicas e a necessidade de ouvir e considerar as evidências e as experiências das/os usuárias/os dos serviços públicos para garantir equidade. As decisões tomadas devem ser informadas por evidências e respeitar os direitos humanos de todas as pessoas.

É de suma importância a não violação dos direitos humanos e considerar as consequências profundas de atos discriminatórios, como exclusões, piadas ofensivas e olhares de desprezo, que podem ter impactos sérios, incluindo o suicídio. Portanto, é crucial promover e proteger os direitos humanos em todas as ações e decisões.

Como defensora das “pequenas revoluções”, acredito na importância de transformar espaços e grupos de maneira gradual e constante. A nossa Secretaria tem um compromisso em deixar um legado positivo, e acredito firmemente que investir em evidências e dados é fundamental para alcançar esse objetivo. É uma jornada desafiadora, mas estou determinada a seguir adiante, lutando por um futuro justo e igualitário.


Contato entrevistada: dayana.brunetto@mdh.gov.br

O Hub LAC participa do I Seminário do projeto ImunizaSUS para políticas informadas por evidências no Brasil

O Hub LAC esteve presente no I Seminário do projeto ImunizaSUS, cujo tema foi “Políticas Informadas por Evidência (PIE) para apoiar as ações de imunização nos municípios”.

O evento foi realizado no dia 17 de maio em Brasília (DF) e foi organizado pelo Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (CONASEMS) com o suporte do Ministério da Saúde do Brasil, da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) e do Centro de Educação Coletiva em Saúde da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (NESCON/UFMG).

Nesta atividade, participaram palestrantes brasileiros e de outros países da América Latina para compartilhar suas experiências e conhecimentos sobre a institucionalização do uso de evidências e a implementação de políticas efetivas de vacinação nos municípios brasileiros.

Duber Osorio, coordenador e pesquisador do Hub LAC, contribuiu para o evento compartilhando a experiência em pesquisa sobre a institucionalização do uso de evidências para a tomada de decisões na Colômbia. Na ocasião, ele apresentou os resultados da pesquisa realizada no Hub LAC e também os resultados da equipe RESSA Colômbia.

Duber Osorio (coordenador do Hub LAC)

O seminário buscou discutir o estado da arte das Políticas Informadas por Evidências, entendida em suas duas facetas principais:  

(a) a utilização sistemática e transparente dos melhores dados e evidências científicas disponíveis, por meio de sínteses das melhores evidências globais e nacionais, apresentando os problemas relacionados às baixas coberturas vacinais, as opções possíveis para enfrentar esses problemas, e a identificação de barreiras e facilitadores para implementar essas políticas de evidências, e 

(b) ênfase da participação social e debate por meio dos diálogos deliberativos na situação em que as evidências serão utilizadas. A situação em que as evidências serão utilizadas em um contexto de restrições políticas, culturais e institucionais, de pressão dos grupos locais antivacina, e de disponibilidade de recursos.

O evento contou também com a apresentação de Lucy Barrientos Kühn, Coordenadora de Projetos da Unidade de Evidências do Ministério da Saúde do Chile e integrante da equipe da direção do Hub LAC. Além de Lucy, antigos parceiros e pessoas inspiradoras para a formação do Hub também estiveram presentes, como Cristián Mansilla, Jorge Barreto e Ulysses Panisset.

Saiba mais sobre o evento aqui

Boletín Informativo

Newsletter #6 Hub LAC

Boletín Informativo

Newsletter #7 Hub LAC

global comission

Hub LAC integra o Conselho de Implementação da Comissão Global de Evidências para Enfrentamento aos Desafios Sociais

O Hub LAC tem o prazer de anunciar que passou a integrar o Conselho de Implementação de Relatórios da Comissão Global de Evidências para Enfrentamento aos Desafios Sociais. A iniciativa, criada pela McMaster University, no Canadá, conta com a contribuição de diversas organizações e lideranças cidadãs por todo o mundo para promover e liderar esforços para implementar as 24 recomendações e três prioridades da Comissão. 

Além do reconhecimento do Hub LAC como organização parceira no esforço para melhorar o uso de evidências para enfrentar os desafios sociais, a participação nos encontros garante o intercâmbio de experiências, a possibilidade de interagir com as outras organizações, fazer propostas e desenvolver atividades voltadas para a implementação dos objetivos em sinergia.

“Celebramos nossa inclusão no conselho de implementação da CGE. Graças a isso, o Hub LAC poderá expandir seu trabalho em rede, compartilhando conhecimentos e experiências com as organizações mais importantes a nível global em matéria de PIE (Política Informada por Evidência) e assim continuar com sua missão de promover a colaboração interdisciplinar e transnacional entre os atores interessados, com o objetivo de institucionalizar a formulação de políticas informadas por evidências na região da América Latina e do Caribe.”, comenta Duber Osório, Coordenador do Hub LAC.

Para Laura Boeira, diretora do Instituto Veredas, que também integra a Comissão, “o Hub LAC ganha importante visibilidade internacional ao compor o Conselho, especialmente reafirmando seu compromisso com o fortalecimento dos ecossistemas de evidências, com a melhoria da arquitetura global de evidências e com a perspectiva de colocar as evidências no centro da vida cotidiana de todas e todos.”

Saiba mais e conheça todas as instituições que integram o Conselho: https://www.mcmasterforum.org/networks/evidence-commission/about-us/who-we-are/implementation-council

Acesse o relatório atualizado (2024) com as 24 prioridades da Comissão [INGLÊS]: https://www.mcmasterforum.org/docs/default-source/evidence-commission/update-2024.pdf 

O papel das evidências científicas na tomada de decisões sobre políticas de regulação alimentar e nutricional no Chile.

Esta entrevista faz parte da série “Voices of Evidence Users”, que oferece perspectivas valiosas de pessoas que usam evidências na tomada de decisões – uma colaboração entre Hub LAC e On Think Tanks. Nesta conversa, o HubLAC entrevista Cristian Cofré sobre o papel e os mecanismos regulatórios dos alimentos no Chile relacionados às evidências científicas.

Cristian Cofré Sasso é assessor técnico do Ministério da Saúde do Chile. Especialista em Políticas Públicas de Saúde e Nutrição/Consultor em políticas públicas e regulação em alimentação e nutrição. Faz parte dos comités consultivos ministeriais sobre impostos alimentares, regulamentação sobre rotulagem e publicidade de bebidas alcoólicas, entre outros. É membro da Comissão Consultiva do Regulamento Sanitário de Alimentos; ele também é co-coordenador do Comitê Nacional do Codex Alimentarius sobre Rotulagem de Alimentos e Coordenador do Comitê Nacional do Codex sobre Nutrição e Alimentos para Usos Dietéticos Especiais.


1. Quais são as questões ou problemas prioritários na sua organização?

Há muitas perguntas a serem feitas porque há muitas políticas sendo desenvolvidas. Especificamente no meu departamento de alimentação e nutrição, um dos temas em que mais dedicamos atualmente (embora não o único) são os relacionados com políticas regulatórias. Tudo o que esteja associado à evidência disponível sobre que tipo de políticas existem em relação à regulação alimentar e nutricional, especificamente nos aspectos relacionados com a rotulagem e publicidade dos alimentos, a fim de fornecer informação ao consumidor.

2. Qual o papel que as evidências científicas desempenharam na abordagem destes problemas ou questões prioritárias, e que parcerias ou sinergias apoiaram ou permitiram este processo?

Há um trabalho em andamento sobre a regulamentação da informação nutricional em restaurantes fast food. Seu objetivo é saber o melhor local onde deve estar essa informação nutricional ou rotulagem. O trabalho tem sido feito com uma unidade do Ministério da Saúde, a Unidade de Política de Saúde Informada por Evidências (UPSIE).

Esta unidade, por sua vez, associou-se a outros intervenientes, como a Universidade Católica do Chile, para desenvolver revisões sistemáticas da literatura e diálogos com os cidadãos.

Precisamente neste último caso, a revisão da literatura e as propostas regulatórias são socializadas para obter a opinião dos cidadãos e dos atores-chave para a implementação de futuras ações neste sentido. Essas informações são processadas para gerar um relatório que apoiará a tomada de decisão para desenhar a política regulatória para fast food. No Chile existe uma iniciativa pioneira no mundo, a rotulagem frontal e o objetivo agora é fazer o mesmo com fast food. Da mesma forma, temos a Política Nacional de Alimentação e Nutrição, cujas linhas de ação também são baseadas em evidências, são experiências de políticas informadas por evidências.

Quanto à frequência das solicitações de evidências, esta não está previamente definida, mas depende das prioridades estabelecidas pela autoridade de saúde relativamente a um assunto de interesse. Na área da nutrição, por exemplo, há uma questão muito relevante: o aumento da obesidade na população infantil e em geral. Isto significa que a solicitação de evidências para a construção e desenho de políticas para enfrentar este problema de saúde tem aumentado nos últimos anos.

3. Quais são os principais desafios e oportunidades que identifica para institucionalizar e incorporar sistematicamente evidências no processo de tomada de decisão?

Os principais desafios que enfrentamos são a falta de recursos humanos especializados, que dediquem o tempo disponível para a tomada de decisões baseadas em evidências. Há uma grande demanda de dúvidas, o que implica priorizar muitas delas devido à ausência de recursos humanos. Este processo leva tempo e pode levar a atrasos na geração de evidências. Por outro lado, as chances de encontrar evidências sobre políticas públicas inovadoras são baixas devido à escassez de informações fundamentadas. Se se trata de formulação de políticas públicas, não apenas os técnicos devem estar envolvidos no uso de evidências; mas também os decisores devem estar conscientes de que as políticas precisam de ser informadas por evidências.

Do lado das oportunidades, as organizações internacionais incentivam o Estado a produzir políticas baseadas em evidências. Isto é feito através de organizações como a ONU, a OMS/OPAS, a FAO e o meio académico, entre outras.

4. Que conselho você daria aos pesquisadores e tomadores de decisão que desejam melhorar o impacto e o uso das evidências científicas nas decisões políticas?

O conselho aos pesquisadores é mostrar paciência para que seu trabalho se reflita nas políticas públicas. Isso dependerá de muitos fatores e prioridades, mas se você for paciente, será alcançado de qualquer maneira. O impacto não será de um mês para o outro ou de um ano para o outro; a definição de uma política levará mais tempo do que isso. Os investigadores devem aproveitar as oportunidades contextuais para o desenvolvimento de políticas baseadas em evidências. É necessário que haja uma ligação estreita entre a investigação e as políticas públicas.

O conselho aos decisores é que as suas ações terão impacto nas pessoas que neles depositaram a sua confiança; estes podem ser os seus pares ou decisores seniores, mas mais importantes são as pessoas que vivem no território. Os decisores devem seguir os princípios de eficácia e eficiência na aplicação de políticas baseadas em evidências. Estas políticas devem beneficiar a sociedade e resolver os problemas que ocorrem. Políticas baseadas em evidências são importantes para qualquer área, especialmente em áreas sensíveis como a saúde.

Hub LAC e Instituto Veredas lançam estudo com mapeamento de experiências em políticas penais de países da Europa, Ásia e Américas

O Hub de Evidências da América Latina e do Caribe (Hub LAC) e o Instituto Veredas realizaram levantamento sobre a estruturação das políticas penais em 14 países localizados na Europa, Ásia e Américas. A publicação “Mapeamento de Experiências Internacionais em Políticas Penais” está disponível a partir desta quinta (9/11) no site das instituições. O trabalho visa contribuir para a atuação das(os) servidoras(es) penais no Brasil, focado nas carreiras e profissões que compõem os serviços da política penal.

A área, abordada pelos levantamentos e análises da publicação, inclui ações de custódia nos estabelecimentos prisionais para pessoas em cumprimento de medida no regime fechado, e responsabilização penal em liberdade para as pessoas em cumprimento de medida no regime aberto.

Segundo Walkiria Zambrzycki, pesquisadora e coordenadora de projetos do Veredas. “É uma publicação inédita e com caráter global, não há outro documento parecido no mundo. Levantamos evidências em 14 países, mas a gente não pode fazer generalizações do que serve para todos. Precisamos respeitar as particularidades e extrair o que pode ser interessante para o nosso contexto. Queremos que a gestão pública possa utilizar esse material para tomar as decisões na área de Direitos Humanos, Justiça Penal e Segurança Pública”.  

Países analisados

O Mapeamento de Experiências Internacionais em Políticas Penais traz dados da França, Finlândia, Itália, Noruega, Portugal, África do Sul, Canadá, Estados Unidos da América, Costa Rica, República Dominicana, Argentina, Bolívia, Chile e Colômbia. A escolha destes países se baseou, preliminarmente, no porte populacional e na respectiva taxa de aprisionamento dos últimos anos, além de outros fatores que se aproximam do caso brasileiro, como a similaridade do contexto histórico e social e os serviços de medidas de responsabilização em liberdade.

A revisão rápida está organizada em seis áreas temáticas: Execução de Penas e Medidas de Responsabilização; Arquitetura Institucional das Políticas Penais; Políticas Intersetoriais para Pessoas Privadas de Liberdade; Carreiras de Profissionais, Funcionárias(os) e Servidoras(es); e Saúde Mental das(os) profissionais nas Políticas Penais.

Alguns achados importantes

  • Em 11 dos 14 países pesquisados, a atribuição do sistema prisional compete ao Ministério da Justiça, com a exceção de 3 países nas Américas: Bolívia e Canadá (competência subordinada à Segurança Pública); e República Dominicana: competência da Procuradoria-Geral da República.
  • Em 13 dos 14 países pesquisados, a carreira ligada à custódia não está dentro da estrutura de servidoras(es) da segurança pública ou forças armadas;
  • Para todos os países pesquisados, há penas e sanções cumpridas fora dos estabelecimentos prisionais. Diferenciam-se, portanto, os equipamentos públicos e estruturação das carreiras das(os) servidoras(es) nas políticas penais:

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Ascom Veredas e Hub LAC

Mapeamento de Experiências Internacionais em Políticas Penais

Autores: Hub LAC e Instituto Veredas