Promovendo o desenvolvimento social no Peru: Aportes da evidência científica
Esta entrevista faz parte da iniciativa “Vozes Ressoantes: Ouvindo as Vozes dos Usuários de Evidências na Região da América Latina e Caribe”. O projeto é um esforço colaborativo com o Hub LAC atuando como implementador e a Overton como financiadora. Nesta entrevista, conversamos com José Enrique Velasquez do Peru.
José Enrique Velasquez é Médico, possui mestrado em Saúde Pública e em Epidemiologia Clínica. Atualmente, atua como professor universitário na Universidade Peruana Cayetano Heredia e como Diretor Geral de Acompanhamento e Avaliação do Ministério de Desenvolvimento e Inclusão Social (MIDIS) no Peru.
1. Quais são as questões ou problemas prioritários na sua organização?
No final de 2022, o MIDIS aprovou a atualização da Política Nacional de Desenvolvimento e Inclusão Social, uma política que reúne 14 setores e identifica 81 serviços. Esta política tem dezenove diretrizes e cinco objetivos prioritários. A Direção de Acompanhamento e Avaliação está atualmente trabalhando em três temas prioritários, nos quais acreditamos que a disponibilidade de evidências é crítica.
O primeiro deles está relacionado à Segurança Alimentar. Hoje estamos trabalhando com maior intensidade nas intervenções mais eficazes para melhorar a segurança alimentar, especialmente para a população pobre e vulnerável.
O segundo tema está relacionado com a pobreza. Estamos em transição de um enfoque unicamente monetário da pobreza para uma medição multidimensional complementar, não apenas pelo trabalho próprio do MIDIS, mas porque acreditamos que a complementação de ambas as medições pode nos proporcionar uma melhor percepção da pobreza na população.
E o terceiro tema está relacionado com os anteriores: é a anemia infantil. Existe a necessidade de melhorar os resultados da anemia em crianças menores de três anos, que é a população na qual focamos nossa atenção, especialmente em menores de 12 meses, pois é o período em que há uma formação intensa das conexões neuronais e onde a porcentagem de crianças com este problema é mais alta.
2. Qual foi o papel das evidências científicas na abordagem desses problemas ou questões prioritárias, e quais parcerias ou sinergias apoiaram ou possibilitaram esse processo?
A evidência científica desempenha um papel fundamental na tomada de decisões, sendo sua aplicação crucial para o setor. Um exemplo recente é o programa de transferência condicionada na primeira infância.
Durante a pandemia, havia uma dúvida sobre como o fechamento dos serviços e a ausência de visitas domiciliares impactariam a população infantil imediatamente após o nascimento.
Realizamos uma busca intensa por evidências internacionais, pois não tínhamos evidências nacionais suficientes para identificar se era esperável obter resultados importantes no desenvolvimento da primeira infância com um programa de transferência condicionada. Encontramos todo tipo de evidências, categorizamos e fizemos uma matriz de evidências.
Graças a essa iniciativa, implementamos um piloto inovador mediante a adaptação de um programa existente chamado “Juntos”. Ampliamos a assistência a gestantes e mães de recém-nascidos e a captação oportuna delas. Foram adicionados serviços como triagem para anemia, suplementação com ferro e acesso à vacinação, coordenados com o Ministério da Saúde. Cumprindo com essas responsabilidades mínimas, era concedida uma transferência ao lar de maneira imediata, complementar à transferência base que alguns desses lares já vinham recebendo.
A evidência respaldou o desenho e a implementação do piloto do programa, facilitando o apoio do Ministério da Economia e Finanças e a posterior aprovação por decreto de urgência do Ministério de Desenvolvimento e Inclusão Social.
Após um ano de implementação, complementamos as evidências iniciais com novos dados, incluindo uma avaliação sobre desnutrição e acesso a serviços para a primeira infância. Esses resultados, juntamente com as evidências internacionais e próprias geradas, respaldaram a proposta de extensão e escalonamento do programa a nível nacional, nos setores rural e urbano.
Para esse trabalho, recebemos o apoio do Banco Interamericano de Desenvolvimento, do Banco Mundial, de um especialista em transferências condicionadas e de instituições acadêmicas.
3. Quais são as principais barreiras e facilitadores que você identifica para institucionalizar e incorporar sistematicamente as evidências no processo de tomada de decisões?
Barreiras
A temporalidade entre a decisão política que precisa ser tomada e o trabalho técnico necessário para reunir a melhor evidência disponível. A demanda por evidências para tomar essas decisões políticas pode ser de até uma semana, enquanto que, do ponto de vista técnico, podemos estar falando de um trabalho de meses para fornecer essa evidência.
A segunda barreira está relacionada com o orçamento. Gostaríamos de ter orçamento suficiente para realizar todas as avaliações e todos os estudos necessários para gerar evidências próprias, mas os recursos são geralmente limitados e insuficientes.
A terceira barreira que eu gostaria de mencionar é o acesso a fontes e recursos de informação de qualidade, e isso está relacionado ao acesso a buscadores. Embora haja um maior investimento na democratização da evidência, ainda temos dificuldades para acessar determinados tipos de evidência.
Um quarto ponto que gostaria de destacar como barreira é a necessidade de trabalhar constantemente para manter umacultura de evidência a nível institucional, uma que facilite as alianças com outras instituições dentro do país, não apenas com a academia, mas também com diferentes organizações do setor público e privado.
Finalmente, um desafio que enfrentamos é conseguir levar a evidência e disponibilizá-la para os diferentes públicos-alvo e fazer com que eles entendam o real alcance da evidência. Isso significa traduzir o conhecimento para os diferentes públicos.
Facilitadores
Uma vez que se usa a evidência para tomar decisões, pode-se gerar, se mantido um contexto propício, um efeito de bola de neve. Assim, a partir de algo pequeno, pode-se fazer algo cada vez maior e gerar uma cultura mínima de tomada de decisões sempre respaldadas na melhor evidência disponível, e isso é algo que deve ser destacado e reforçado.
Obtivemos resultados destacados ao compartilhar nossas evidências no portal Evidência MIDIS e ao envolver pesquisadores internacionais em outros espaços. Essas colaborações nos permitiram acessar novas evidências internacionais, fortalecendo nossas avaliações e resultados. Identificar e aproveitar oportunidades semelhantes pode conduzir a mais resultados positivos.
4. Quais conselhos você daria a pesquisadores e responsáveis pela tomada de decisões que querem melhorar o impacto e o uso da evidência científica nas decisões políticas?
O tomador de decisões precisa entender que suas decisões terão um maior respaldo e um melhor resultado (que também pode ser medido politicamente) na medida em que estiverem apoiadas em evidências. Os tomadores de decisão estão sujeitos a julgamentos, questionamentos e controle interno pelas decisões que tomam, mas isso pode ser claramente resolvido de forma satisfatória se as decisões forem baseadas em evidências.
Eles também podem projetar uma imagem diferente para os meios de comunicação, o que os posiciona de uma maneira distinta.
As necessidades do tomador de decisões na esfera política podem diferir das da academia. Portanto, para que os pesquisadores consigam que os tomadores de decisões utilizem a evidência, é crucial identificar as necessidades no âmbito político.
Os pesquisadores, especialmente na academia, precisam entender que o político precisa tomar decisões rápidas.
Por último, uma vez reunida a melhor evidência disponível, é fundamental disponibilizá-la em espaços de divulgação e reflexão, quando apropriado e com as pessoas adequadas.
Contato do entrevistado: jvelasquez@midis.gob.pe
Uso de evidências para fortalecer a atenção à Saúde na Colômbia
Esta entrevista faz parte da iniciativa “Resonating Voices: Ouvindo as Vozes dos Usuários de Evidências na Região da América Latina e Caribe”. O projeto é um esforço colaborativo com o Hub LAC atuando como implementador e a Overton como financiadora. Nesta conversa, o Hub LAC dialoga com John Edison, da Colômbia.
John Edison é Administrador de Saúde e Advogado, com Mestrado em Epidemiologia. Atualmente, ele atua como Assessor do Vice-Ministro de Proteção Social no Ministério da Saúde e Proteção Social da Colômbia.
1. Quais são as questões ou problemas prioritários na sua organização?
A sustentabilidade financeira do sistema de saúde é uma questão urgente na qual temos trabalhado. Em particular, problemas relacionados à produção de novas tecnologias de saúde. Isso tem sido um problema recorrente não apenas no nosso sistema, mas em todo o mundo, pois levou a um rápido aumento nos custos nos últimos anos, causando preocupações significativas sobre os recursos.
Outra questão está relacionada à implementação de redes de serviços abrangentes e integradas e estratégias de atenção primária à saúde, envolvendo especialmente o nível primário de atendimento.
Por fim, a principal atividade que estou apoiando é atualmente o projeto de reforma do Sistema Geral de Segurança Social. É um projeto de reforma explicitamente liderado por este Vice-Ministério. Estamos gerando tudo relacionado à proposta deste projeto e todo o progresso sendo atualmente feito no Congresso da República.
2. Qual foi o papel das evidências científicas na abordagem desses problemas ou questões prioritárias, e quais parcerias ou sinergias apoiaram ou possibilitaram esse processo?
A evidência é crucial. A maioria de nós envolvidos nesse processo de reforma vem do meio acadêmico, e cada decisão e artigo sendo trabalhados e acordados são baseados na melhor evidência disponível.
Em relação às estratégias de atenção primária, especificamente no que diz respeito às equipes básicas de saúde e à redução dos gastos com saúde, diferentes departamentos do Ministério têm conduzido revisões de literatura. Especificamente, o departamento de Promoção e Prevenção (PYP) tem realizado exercícios focados em definir quais profissionais devem compor essas equipes básicas de saúde e estimar os gastos com essas estratégias, com base no que foi feito em outros sistemas de saúde. Da mesma forma, as revisões de literatura têm se concentrado nas atividades que poderiam ser realizadas em termos de cuidado extramural.
Também criamos espaços de trabalho colaborativos para definir questões na estrutura PICO (Paciente, Intervenção, Comparação e Resultado) e conduzir uma revisão da literatura. Particularmente, um mapa de evidências foi criado com o apoio da BIREME (Centro Latino-Americano e do Caribe de Informação em Ciências da Saúde) e da OPS. Isso levou a uma síntese de evidências que orientou a estimativa de gastos mencionada para as equipes de APS (Atenção Primária à Saúde) e agora é usada como suporte para justificar a maioria dos pedidos feitos por senadores, congressistas e a sociedade civil, que exigem esse tipo de evidência.
Em relação às parcerias, temos acordos com universidades como a Universidade de Antioquia, a Universidade Nacional, a Universidade dos Andes e a Universidade Javeriana.
Existem outros tipos de acordos de governos anteriores, como o acordo com a Health Metrics para realizar estudos sobre a carga econômica das doenças.
Em termos de cooperação internacional, novamente, temos acordos com a OPS, USAID (Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional), OIM (Organização Internacional para as Migrações) e a Agência Francesa de Desenvolvimento, entre outros, que incluem centros de pesquisa e instituições geradoras de evidências.
3. Quais são as principais barreiras e facilitadores que você identifica para institucionalizar e incorporar sistematicamente evidências no processo de tomada de decisão?
Barreiras:
A principal barreira é o tempo. Frequentemente, recebemos solicitações de evidências em um curto período, durante o qual devemos reunir as melhores evidências disponíveis e apoiar uma decisão que já foi tomada ou está prestes a ser tomada.
Outra barreira é a falta de treinamento ou educação contínua em termos de novas técnicas e estratégias de pesquisa.
A definição de competências e o manual de funções também podem se tornar uma barreira, pois, às vezes, os tempos ou o perfil específico para a realização de atividades relacionadas à produção e uso de evidências não estão definidos.
A estrutura atual do sistema, criada há mais de 30 anos, talvez não tenha sido planejada particularmente com a necessidade urgente e imediata de incluir grupos geradores de evidências dentro das instituições públicas. Isso tem levado muitas instituições a passarem por transformações.
Por fim, os recursos econômicos disponíveis para cada entidade podem ser uma barreira. Os orçamentos são planejados para funções específicas e, raramente, incluem funções específicas para questões como a revisão de evidências. Não há um orçamento explícito para isso, nem pessoas dedicadas exclusivamente a essa função.
Facilitadores:
O dinamismo e a modernização do Estado, onde buscamos revisar bem essas funções e esperamos que possam haver funções específicas para apoiar o uso de evidências. Quando as instituições têm acesso às melhores evidências disponíveis, elas se transformam.
O apoio de organizações de cooperação internacional, acordos desenvolvidos com centros de estudos, centros de pesquisa e instituições dedicadas a trabalhar com evidências.
A precisão das evidências é um facilitador muito importante, pois todo ato administrativo está sujeito ao escrutínio público. Nesse sentido, as evidências são um mecanismo de apoio e defesa muito importante que temos contra os órgãos de fiscalização.
A facilidade de acesso às evidências também é um facilitador importante. A literatura científica é mais acessível do que há alguns anos.
Outro facilitador é que atualmente temos o Ministério da Ciência, que também faz parte dos órgãos de tomada de decisão.
Por fim, graças aos acordos com universidades e programas acadêmicos, foram criadas oportunidades para que certos funcionários recebam treinamento, gerando benefícios em termos de capacitação.
4. Que conselho você daria a pesquisadores e tomadores de decisão que querem melhorar o impacto e o uso de evidências científicas nas decisões políticas?
Para os pesquisadores, o conselho é estar muito consciente da realidade política do sistema. Diferentes temas de pesquisa surgem daí para orientar a tomada de decisões. Frequentemente, os pesquisadores se concentram apenas no contexto que podem discernir nos centros de estudo e raramente conhecem a realidade política e contextual do sistema como um todo. Se conseguirmos inserir a academia nesses cenários políticos, acredito que uma sinergia importante pode ser gerada.
E para os envolvidos na tomada de decisões, o principal conselho que eu daria é que, em termos práticos, as evidências reduzem a incerteza das decisões, e isso pode contribuir para gerar políticas públicas precisas que se adequem à realidade da população. Sempre temos órgãos de fiscalização observando e prestando atenção às decisões que tomamos, e as evidências se tornam um mecanismo probatório para defender a decisão tomada. Tudo isso ajuda a garantir que o sucesso de qualquer decisão possa se traduzir melhor no âmbito da política pública.
Contato do entrevistado: edison.betancur@udea.edu.co
Conquistas e desafios da produção e uso de evidências para a promoção dos direitos das pessoas LGBTQIA+ no Brasil
Esta entrevista faz parte do projeto ‘Resonating voices: Escutando as vozes das/os usuárias/os de evidências na região da América Latina e Caribe (LAC)’. Este projeto é realizado graças à colaboração entre o Hub LAC, como executor, e a Overton, como financiador. Nesta conversa, o Hub LAC fala com Dayana Brunetto do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania do Brasil.
1. Quais são as questões ou problemas prioritários na sua organização?
Trabalhar na nova Secretaria Nacional dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+ tem sido uma experiência desafiadora e gratificante ao mesmo tempo. É a primeira secretaria nacional dos direitos das pessoas LGBTQIA+ no mundo. Então ela está muito em foco, tanto como alvo dos ataques do conservadorismo, quanto como referência para outros países e lugares do mundo, por ser a primeira estrutura em segundo escalão de governo para cuidar dessas políticas, das pessoas e promover a transformação de suas vidas.
Na nossa secretaria, enfrentamos uma série de questões prioritárias que impactam diretamente nosso trabalho, nossos objetivos e principalmente a vida das pessoas LGBTQIA+. Uma delas é a ausência ou a insuficiência e instabilidade dos dados disponíveis. Apesar dos dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE abordarem a orientação sexual, geralmente quem responde é a pessoa responsável pelo domicílio daquela família. Então, caso seja um pai, uma mãe ou responsável lesbofóbica/o, por exemplo, eles não vão falar que a filha é lésbica, corroborando para uma subnotificação desses dados.
Outro problema prioritário é o enfrentamento dos efeitos do poder do discurso de ódio na sociedade, especialmente em relação às pessoas LGBTQIA+. A disseminação do factóide “ideologia de gênero” tem prejudicado a abordagem de gênero por professoras e professores, pesquisadoras e pesquisadores, levando à desvalorização das pesquisas e à perseguição de profissionais da área, além de incentivar as violências e a violação de direitos. A “ideologia de gênero” é um discurso mentiroso e criminoso, porque promete proteger as crianças, mas, na verdade protege o estuprador. Uma vez que a escola pode ser o único espaço com o qual a criança pode contar para denunciar as violências sexuais que sofre em casa. Quando você tira as discussões sobre gênero e sexualidade numa perspectiva de Direitos Humanos da escola, retira também a possibilidade de algum apoio a criança e adolescente vítima de violência sexual.
2. Qual o papel que as evidências científicas desempenharam na abordagem destes problemas ou questões prioritárias, e que parcerias ou sinergias apoiaram ou possibilitaram este processo?
Um dos nossos principais esforços é a produção de dados estáveis e confiáveis. Logo, elaboramos um formulário padrão, com questões mínimas e alternativas padronizadas para a coleta de dados sobre pessoas LGBTQIA+. Este formulário foi referendado pelo Conselho Nacional dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+ e pode ser utilizado por órgãos públicos e por pesquisadoras/es e institutos para coletar informações relevantes sobre esses grupos. Estamos trabalhando em uma nota técnica, com um parecer, a ser encaminhada para todos os órgãos públicos que coletam dados, com as questões, para que haja implementação. No entanto, ainda encontramos obstáculos institucionais e por vezes resistência por parte daqueles que não compartilham dos nossos objetivos e da valorização dos direitos humanos de todas as pessoas.
Nesse processo, buscamos diferentes fontes de informações e evidências científicas para embasar nossas decisões. Também temos um trabalho muito interligado com o Observatório Nacional dos Direitos Humanos – ObservaDH e com a ReneDH – Rede Nacional de Evidências em Direitos Humanos, instâncias do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania – MDHC. Uma das abordagens que temos adotado é trabalhar em parceria com consultorias especializadas. Acreditamos que essas parcerias podem preencher lacunas importantes e nos fornecer insights valiosos.
Um exemplo significativo de pesquisas realizadas por movimentos sociais organizados é o I LesboCenso Nacional, uma pesquisa ativista-acadêmica fundamental para estabelecer uma agenda governamental concreta, culminando na criação da Agenda Nacional de Enfrentamento à Lesbofobia e ao Lesbo-ódio. Uma parceria interministerial em conjunto com o Ministério da Igualdade Racial, Ministério das Mulheres e com o Ministério dos Povos Indígenas.
Com 21.050 respostas em todo o país, o censo revelou dados impactantes, indicando que oito em cada dez lésbicas no Brasil já sofreram lesbofobia, por exemplo. Além disso, aproximadamente 7 em cada 10 já foram estupradas, com ou sem penetração. Esses resultados têm impulsionado debates e ações em áreas como saúde, educação, segurança pública, assistência social e cultura. A fase em andamento envolve entrevistas para aprofundar os dados quantitativos. Na última fase da pesquisa será realizada formação política para promover políticas públicas informadas por evidências.
Instituímos também o Conselho Nacional dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+, com 38 representações, sendo 19 dos movimentos sociais e 19 governamentais. Acreditamos que a política pública precisa da participação social de quem está no território na produção das evidências. Portanto, estabelecemos um diálogo contínuo entre os movimentos sociais e o governo, garantindo que as políticas propostas sejam assertivas, viáveis e eficazes.
3. Quais são as principais barreiras e facilitadores que identifica para institucionalizar e incorporar sistematicamente evidências no processo de tomada de decisão?
Barreiras
Uma das principais barreiras que enfrentamos são os efeitos do discurso de ódio na sociedade. Esse discurso permeia diversos espaços, incluindo a gestão pública, a universidade e a escola, tornando mais difícil a implementação de políticas informadas em evidências nesta área. Essa realidade é especialmente dolorosa para quem trabalha com direitos humanos, pois confrontamos diariamente a negação do direito à igualdade e ao respeito à dignidade humana de todas as pessoas.
Outro desafio significativo é o orçamento restrito, que impacta não apenas a obtenção de evidências, mas todas as nossas atividades. No entanto, mesmo com recursos limitados, buscamos realizar formações, iniciativas e pactuações que promovam o enfrentamento às violências contra as pessoas LGBTQIA+ e outras formas de discriminação, bem como promovam a valorização dos direitos humanos dessas pessoas.
A pactuação para a produção de dados também acaba sendo uma barreira, pois ainda temos muita confusão com os principais conceitos que sistematizam minimamente as nossas subjetividades, como sujeitas/es/os LGBTQIA+, além de que a nossa pauta não é consensual por uma frente ampla de atrizes e atores políticos. Logo, essa confusão teórica, epistemológica e política, soma-se à questão do conservadorismo, do moralismo e dos efeitos de poder dos discursos de ódio nas realidades territoriais, o que acaba dificultando a coleta de dados e, consequentemente, a produção das evidências e das análises..
Facilitadores
Apesar dessas barreiras, reconheço que existem oportunidades para avançar nesse processo. Uma delas é o fortalecimento das parcerias com movimentos sociais, academia e organismos internacionais, que pode fornecer apoio e expertise na produção e utilização de evidências. Além disso, acreditamos que devemos buscar alternativas criativas para institucionalizar práticas informadas em evidências, mesmo diante da falta de apoio legislativo.
Ainda há muito trabalho a ser feito para superar essas barreiras e garantir que nossas políticas sejam informadas por evidências sólidas e direcionadas às necessidades reais da população. Acreditamos que, com uma abordagem colaborativa e informada por evidências, podemos fazer progressos significativos na promoção, proteção e defesa dos direitos e no enfrentamento das violências, violações de direitos e desigualdades.
4. Que conselho você daria às/aos pesquisadoras/es e tomadoras/es de decisão que desejam melhorar o impacto e o uso das evidências científicas nas decisões políticas?
Em relação às/aos pesquisadoras/es é importante que estabeleçam um diálogo efetivo com as pessoas e comunidades afetadas pelo tema de pesquisa, mesmo que não sejam necessariamente parte desse grupo. Não é preciso ser um sujeito específico para pesquisar sobre determinado assunto, mas é essencial ouvir e compreender as experiências e perspectivas das pessoas envolvidas. As/Os pesquisadoras/es precisam estar abertas/os e receptivas/os às mudanças e movimentos da sociedade, adaptando-se e aprendendo com essas transformações contínuas.
Também existe a necessidade de colaboração entre pesquisadoras/es e tomadoras/es de decisão em todos os níveis, desde o federal até os níveis locais, para garantir que as políticas e decisões sejam informadas por evidências robustas e relevantes.
Já para as/os tomadoras/es de decisão, é preciso que se tenha um compromisso ético-político de oferecer serviços públicos de qualidade e um atendimento ético para todas as pessoas. Isso precisa acontecer pela via do profissionalismo, independentemente das crenças pessoais das/os tomadoras/es de decisão. Além disso, é importante a formação adequada das/os profissionais envolvidas/os em políticas públicas e a necessidade de ouvir e considerar as evidências e as experiências das/os usuárias/os dos serviços públicos para garantir equidade. As decisões tomadas devem ser informadas por evidências e respeitar os direitos humanos de todas as pessoas.
É de suma importância a não violação dos direitos humanos e considerar as consequências profundas de atos discriminatórios, como exclusões, piadas ofensivas e olhares de desprezo, que podem ter impactos sérios, incluindo o suicídio. Portanto, é crucial promover e proteger os direitos humanos em todas as ações e decisões.
Como defensora das “pequenas revoluções”, acredito na importância de transformar espaços e grupos de maneira gradual e constante. A nossa Secretaria tem um compromisso em deixar um legado positivo, e acredito firmemente que investir em evidências e dados é fundamental para alcançar esse objetivo. É uma jornada desafiadora, mas estou determinada a seguir adiante, lutando por um futuro justo e igualitário.
Contato entrevistada: dayana.brunetto@mdh.gov.br
O papel das evidências científicas na tomada de decisões sobre políticas de regulação alimentar e nutricional no Chile.
Esta entrevista faz parte da série “Voices of Evidence Users”, que oferece perspectivas valiosas de pessoas que usam evidências na tomada de decisões – uma colaboração entre Hub LAC e On Think Tanks. Nesta conversa, o HubLAC entrevista Cristian Cofré sobre o papel e os mecanismos regulatórios dos alimentos no Chile relacionados às evidências científicas.
Cristian Cofré Sasso é assessor técnico do Ministério da Saúde do Chile. Especialista em Políticas Públicas de Saúde e Nutrição/Consultor em políticas públicas e regulação em alimentação e nutrição. Faz parte dos comités consultivos ministeriais sobre impostos alimentares, regulamentação sobre rotulagem e publicidade de bebidas alcoólicas, entre outros. É membro da Comissão Consultiva do Regulamento Sanitário de Alimentos; ele também é co-coordenador do Comitê Nacional do Codex Alimentarius sobre Rotulagem de Alimentos e Coordenador do Comitê Nacional do Codex sobre Nutrição e Alimentos para Usos Dietéticos Especiais.
1. Quais são as questões ou problemas prioritários na sua organização?
Há muitas perguntas a serem feitas porque há muitas políticas sendo desenvolvidas. Especificamente no meu departamento de alimentação e nutrição, um dos temas em que mais dedicamos atualmente (embora não o único) são os relacionados com políticas regulatórias. Tudo o que esteja associado à evidência disponível sobre que tipo de políticas existem em relação à regulação alimentar e nutricional, especificamente nos aspectos relacionados com a rotulagem e publicidade dos alimentos, a fim de fornecer informação ao consumidor.
2. Qual o papel que as evidências científicas desempenharam na abordagem destes problemas ou questões prioritárias, e que parcerias ou sinergias apoiaram ou permitiram este processo?
Há um trabalho em andamento sobre a regulamentação da informação nutricional em restaurantes fast food. Seu objetivo é saber o melhor local onde deve estar essa informação nutricional ou rotulagem. O trabalho tem sido feito com uma unidade do Ministério da Saúde, a Unidade de Política de Saúde Informada por Evidências (UPSIE).
Esta unidade, por sua vez, associou-se a outros intervenientes, como a Universidade Católica do Chile, para desenvolver revisões sistemáticas da literatura e diálogos com os cidadãos.
Precisamente neste último caso, a revisão da literatura e as propostas regulatórias são socializadas para obter a opinião dos cidadãos e dos atores-chave para a implementação de futuras ações neste sentido. Essas informações são processadas para gerar um relatório que apoiará a tomada de decisão para desenhar a política regulatória para fast food. No Chile existe uma iniciativa pioneira no mundo, a rotulagem frontal e o objetivo agora é fazer o mesmo com fast food. Da mesma forma, temos a Política Nacional de Alimentação e Nutrição, cujas linhas de ação também são baseadas em evidências, são experiências de políticas informadas por evidências.
Quanto à frequência das solicitações de evidências, esta não está previamente definida, mas depende das prioridades estabelecidas pela autoridade de saúde relativamente a um assunto de interesse. Na área da nutrição, por exemplo, há uma questão muito relevante: o aumento da obesidade na população infantil e em geral. Isto significa que a solicitação de evidências para a construção e desenho de políticas para enfrentar este problema de saúde tem aumentado nos últimos anos.
3. Quais são os principais desafios e oportunidades que identifica para institucionalizar e incorporar sistematicamente evidências no processo de tomada de decisão?
Os principais desafios que enfrentamos são a falta de recursos humanos especializados, que dediquem o tempo disponível para a tomada de decisões baseadas em evidências. Há uma grande demanda de dúvidas, o que implica priorizar muitas delas devido à ausência de recursos humanos. Este processo leva tempo e pode levar a atrasos na geração de evidências. Por outro lado, as chances de encontrar evidências sobre políticas públicas inovadoras são baixas devido à escassez de informações fundamentadas. Se se trata de formulação de políticas públicas, não apenas os técnicos devem estar envolvidos no uso de evidências; mas também os decisores devem estar conscientes de que as políticas precisam de ser informadas por evidências.
Do lado das oportunidades, as organizações internacionais incentivam o Estado a produzir políticas baseadas em evidências. Isto é feito através de organizações como a ONU, a OMS/OPAS, a FAO e o meio académico, entre outras.
4. Que conselho você daria aos pesquisadores e tomadores de decisão que desejam melhorar o impacto e o uso das evidências científicas nas decisões políticas?
O conselho aos pesquisadores é mostrar paciência para que seu trabalho se reflita nas políticas públicas. Isso dependerá de muitos fatores e prioridades, mas se você for paciente, será alcançado de qualquer maneira. O impacto não será de um mês para o outro ou de um ano para o outro; a definição de uma política levará mais tempo do que isso. Os investigadores devem aproveitar as oportunidades contextuais para o desenvolvimento de políticas baseadas em evidências. É necessário que haja uma ligação estreita entre a investigação e as políticas públicas.
O conselho aos decisores é que as suas ações terão impacto nas pessoas que neles depositaram a sua confiança; estes podem ser os seus pares ou decisores seniores, mas mais importantes são as pessoas que vivem no território. Os decisores devem seguir os princípios de eficácia e eficiência na aplicação de políticas baseadas em evidências. Estas políticas devem beneficiar a sociedade e resolver os problemas que ocorrem. Políticas baseadas em evidências são importantes para qualquer área, especialmente em áreas sensíveis como a saúde.
Sinergia entre academia, cidadãos e tomadores de decisão para a promoção e o uso de evidências na Colômbia
Esta entrevista faz parte da série “Voices of Evidence Users”, que oferece perspectivas valiosas de pessoas que usam evidências na tomada de decisão – uma colaboração entre Hub LAC e On Think Tanks. Nesta conversa, o HubLAC entrevista Carlos Castaneda sobre o papel e os mecanismos de uso e geração de evidências na Colômbia.
Carlos é economista pela Universidade de Antioquia, possui mestrado em economia pela Universidade de Los Andes e mestrado em Políticas Públicas e Sociais pela Universidade Pompeu Fabra. Atualmente é Diretor de Monitoramento e Avaliação de Políticas Públicas do DNP – Departamento Nacional de Planejamento da Colômbia.
Quais são as questões ou problemas prioritários na sua organização?
As questões prioritárias são a avaliação de programas estratégicos vinculados ao Plano de Desenvolvimento Nacional (PDN) do país. Precisamente, uma das responsabilidades do Departamento Nacional de Planeamento (DNP) é elaborar este plano em conjunto com o Ministério das Finanças e os restantes setores do Governo Nacional.
Precisamente, o DNP definiu cinco linhas estratégicas e duas linhas transversais nas quais acreditamos que o país deve apostar para o desenvolvimento a médio e longo prazo, estas linhas são: 1) Gestão do território em torno da água com justiça ambiental: alterações climáticas, 2) eixo de segurança humana e justiça social, 3) direito humano à alimentação (transformação do sector agrícola, produção alimentar e segurança alimentar), 4) transformação produtiva, internacionalização e ação climática e 5) convergência regional. Tudo isto está enquadrado em dois temas transversais: paz abrangente e estabilidade macroeconómica. Também trabalhamos no âmbito da Agenda 2030 dos ODS.
Qual o papel que as evidências científicas desempenharam na abordagem destes problemas ou questões prioritárias, e que parcerias ou sinergias apoiaram ou permitiram este processo?
Um exemplo concreto do uso de evidências tem sido o uso de mapas de lacunas de evidências para identificar quais ações funcionaram no mundo em relação aos programas de renda cidadã. Menciono isto porque a Colômbia pretende migrar de transferências condicionais de dinheiro para estratégias de renda incondicional. Esta é uma das formas de disponibilizar evidências aos decisores em programas futuros.
Outro exemplo é o programa “Mi casa ya”, um programa habitacional que subsidiava pessoas de classe média e média baixa para que pudessem obter habitação. Fizemos uma avaliação de impacto há cerca de dois anos e os resultados dessa avaliação permitiram ao Ministério da Habitação tomar decisões que permitiram a reestruturação do programa.
Quanto aos tipos de evidências, estas podem ser diferentes dependendo do grau de maturidade dos programas. O que fazemos é tentar ser inovadores na forma como fornecemos ou transmitimos evidências aos decisores, por vezes um mapa de evidências é mais útil, por vezes um infográfico, vídeo entre outros.
Toda a evidência que geramos é levada aos órgãos de decisão, aos conselhos de ministros e aos comitês que gerem alocação de orçamento a médio prazo, onde é definido o orçamento alocado a cada setor.
Trabalhamos em várias etapas para identificar onde as evidências são necessárias e contamos, como mencionado acima, com as diferentes agências dos ministérios e com empresas de consultoria e instituições nacionais como Fedesarrollo, think tanks, e a Universidade Nacional e Javeriana da Colômbia. Também fazemos parcerias com agências internacionais como The Global Evaluation Initiative, Universidade de Berkeley, Universidade de Toronto e professores associados à Universidade de Chicago.
Relativamente ao envolvimento da perspetiva dos cidadãos, temos as enquetes de percepção cidadã, que são realizadas anualmente, em que procuramos conhecer as perspectivas, outra fonte de evidências para guiar as ofertas do governo. Isso nos permite monitorar as lacunas entre o que o governo está oferecendo e o que a população está percebendo.
Tudo o que geramos é público, os cidadãos podem baixar relatórios, dados, pesquisas, etc., para replicar exercícios, ou aprofundar os resultados. Queremos que os cidadãos se aproximem e que o governo participe também.
Quais são os principais desafios e oportunidades que identifica para institucionalizar e incorporar sistematicamente evidências no processo de tomada de decisão?
Entre os desafios existentes, descobrimos que para desenvolver avaliações rigorosas precisaríamos de mais tempo do que realmente temos. Para acompanhar esse processo, procuramos ter um banco de dados para realizar os exercícios com rapidez. Nesse sentido, se não houver pesquisas acadêmicas, incorporamos ferramentas mais rápidas como o machine learning, que permite a geração de evidências em tempo hábil.
Outro desafio é que vimos que a utilização de provas é anedótica, uma vez que não existe uma medição sistemática da forma como são utilizadas. Estamos desenvolvendo um índice de uso de avaliação que nos permitirá medir como e quando as evidências que estamos gerando estão sendo utilizadas. Isto nos permite ver quando as recomendações são implementadas e como as mudanças estão ocorrendo.
Por outro lado, nem sempre existe vontade política entre os decisores; em outras palavras, as diretrizes de um programa podem não exigir que ele seja avaliado.
Outra grande preocupação é encontrar a melhor forma de comunicar os resultados das avaliações porque os documentos são muitas vezes demasiadamente extensos e correm o risco de não serem lidos. As evidências já demonstram, por diversas plataformas, que para atrair o público em geral é necessário contar com informações curtas e chamativas.
Entre as oportunidades, também contamos com ferramentas robustas e com qualidade técnica para informar e tomar decisões, que compartilhamos com países como Costa Rica e Peru para nos mantermos atualizados com o que está acontecendo nos países vizinhos.
E, finalmente, na Colômbia temos o CONPES 4083 de 2022 para o fortalecimento do uso e institucionalização de avaliações para a tomada de decisões. Isto nos dá o arcabouço legal que nos obriga a implementar todas as ações relacionadas às evidências e oferece uma visão geral do uso das evidências no país juntamente com ações de melhoria para consolidar nossa organização (SINERGIA).
Que conselho você daria aos pesquisadores e tomadores de decisão que desejam melhorar o impacto e o uso das evidências científicas nas decisões políticas?
O conselho aos pesquisadores consiste em facilitar avaliações para que as recomendações políticas possam ser utilizadas. É preciso utilizar mecanismos para comunicar o que há de mais relevante. Por exemplo, aconselha-se uma matriz para a utilização de recomendações para incentivar a apresentação dos resultados de uma forma clara e simples aos especialistas.
O conselho aos decisores é que compreendam melhor quais as avaliações e os diferentes tipos de evidências que estão sendo reportados. Por exemplo, 90% dos decisores afirmam frequentemente que o que necessitam é de uma avaliação de impacto e quando clarificamos em que consiste a avaliação, percebem que não precisam deste tipo de provas, mas de outros tipos de provas. Os decisores precisam estar mais bem informados sobre o método de avaliação que o seu programa exige, a fim de chegarem a um acordo comum com os responsáveis pela pesquisa. Por fim, é necessário mencionar a necessidade de estabelecer sinergias entre pesquisadores e decisores para discutir e analisar os diferentes tipos de evidências.
Contato:
cacastaneda@dnp.gov.co
Fortalecendo a democracia brasileira com políticas públicas digitais
Essa entrevista faz parte da série “Vozes de Usuários de Evidências”, que oferece valiosas perspectivas de pessoas que utilizam evidências na tomada de decisões – uma colaboração entre o Hub LAC e a On think tanks.
Nesta conversa, o Hub LAC falou com Samara Mariana de Castro, advogada com trajetória no campo do direito marcada pela atuação nas áreas de Direito Eleitoral e Partidário, Direito Digital, Privacidade e Proteção de Dados.
Em 2023, Samara assumiu a Diretoria do Departamento de Promoção da Liberdade de Expressão da nova Secretaria de Políticas Digitais da Secretaria de Comunicação da Presidência da República (SECOM), onde tem a oportunidade de construir um ambiente de pioneirismo para informar com as melhores evidências disponíveis as políticas públicas digitais no Brasil. Nesta entrevista, ela discute avanços e desafios que ela e sua equipe têm enfrentado nesta trajetória.
Como tem se dado sua atuação e quais são os problemas prioritários da sua gestão enquanto diretora do Departamento de Promoção da Liberdade de Expressão da Secretaria de políticas digitais?
Na minha direção, lidamos com diversos desafios. Isso inclui apoiar a sustentabilidade do jornalismo em meio às mudanças na publicidade, regulamentar os serviços digitais enfrentando a desinformação e estimulando valores sólidos de liberdade de expressão para a era digital. Além disso, o departamento atua em um ambiente de pioneirismo, onde muitos problemas ainda não têm soluções evidentes. Somos uma Secretaria inédita e temos o desafio de estarmos em um ministério palaciano, ou seja, que não tem carreira ou servidores próprios. Nesse sentido, não trabalhamos com uma memória como outros ministérios, estamos criando nossa própria história agora.
A SECOM anterior estava no Ministério das Comunicações, não houve transição em áreas críticas, então estamos reelaborando uma nova estrutura. Nosso trabalho hoje também se contrapõe aos processos criados pelo governo anterior, que trabalhava em uma lógica de desinformação e desconfiança contra adversários e outros poderes, no arranjo que ficou conhecido na mídia como o ‘gabinete do ódio’. Nossos desafios não são específicos à realidade brasileira.
São desafios que governos democráticos pelo mundo todo estão enfrentando concomitantemente, sendo os assuntos novos e emergentes.
Qual o papel das evidências para resolver esses problemas prioritários? Como você coopera e busca apoio com centros de pesquisa e redes no governo e na sociedade civil para se informar melhor dos desafios e soluções a seu alcance?
As evidências desempenham um papel crucial na tomada de decisões. O governo depende delas para convencer legisladores em questões regulatórias, usando principalmente relatórios executivos, contendo pesquisas quantitativas e qualitativas. A busca ativa dessas evidências é feita em parceria com organizações da sociedade civil, academia e indústria, além da minha rede de contatos pessoais e de canais diretos com os poderes legislativo e judiciário. T
Também buscamos experiências internacionais, principalmente latinoamericanas e de outros contextos globais para criar políticas de publicidade institucional preocupadas em garantir um ambiente informacional íntegro e confiável, que não financie direta ou indiretamente conteúdos ilegais, perigosos ou desinformativos, garantindo isonomia e direitos.
Para isso, uma nova secretaria foi criada na SECOM, a Secretaria de Análise, Estratégia e Articulação (SEART), pensada para apoiar a tomada de decisões informada por evidências no que concerne ao tema das políticas digitais. Podemos dizer que também atuamos como um Hub de evidências para outros ministérios, coordenando ações interministeriais em questões específicas que necessitem da nossa colaboração.
Um exemplo prático recente de atuação da nossa equipe foi a criação de um plano estratégico no combate à desinformação na vacinação. Foram realizadas chamadas para áreas diversas do governo de (Ministério da Saúde, Advocacia Geral da União-AGU, Ministério da Justiça, Ministério da Gestão e da Informação, Ministério da Ciência e da Tecnologia, Ministério das Comunicações e Controladoria Geral da União), realizando reuniões com cada ministério, de acordo com os pontos que precisavam ser alinhados para se alcançar um trabalho integrado entre essas esferas.
Ferramentas de comunicação, até mesmo as mais informais, como o WhatsApp, estão sendo utilizadas para divulgar informações confiáveis de maneira simples e amigável, fácil de entender por gestores públicos com diferentes níveis de conhecimento nos seus temas de atuação. Também buscamos garantir a participação social através de pesquisas públicas e reuniões abertas na tomada de decisões.
Quais são os principais desafios que vê para incorporar sistematicamente as evidências no processo de tomada de decisões?
Alguns dos principais desafios que enfrentamos são a falta de dados confiáveis e o acesso limitado a informações das plataformas digitais. O que temos são dados aproximados que indicam tendências gerais, mas não explicam os fenômenos na granularidade necessária para informar nossas políticas. Como se tratam de desafios contemporâneos, ainda há lacunas de informação. Não existem tantas experiências bem sucedidas, e há que se enfrentar ainda regimes anti-democráticos, que direcionam as políticas de maneira oposta ao que buscamos.
Além disso, há uma carência de financiamento para institucionalizar estruturas de apoio à tomada de decisões. Dentro do governo percebo uma fragmentação e dificuldade na organização, curadoria e análise da vasta gama de informações que recebemos quase todos os dias.
Que conselhos daria aos pesquisadores (as) e tomadores de decisão que pretendem melhorar o uso de evidências?
Para os pesquisadores, é fundamental construir uma rede de advocacy, conectando-se a organizações que possam impulsionar as informações mais relevantes aos tomadores de decisão de forma personalizada a suas demandas. É importante frisar isso: a entrega das evidências deve ser adaptada ao público-alvo, evitando relatórios padronizados e que não dialoguem com quem precisa tomar as decisões a partir deles..
Quanto aos tomadores de decisão, é essencial garantir canais para que as evidências cheguem a quem precisa e em tempo ótimo. É também preciso capacitação para que as evidências sejam processadas de maneira ótima.
Traduzir as informações para facilitar a compreensão e ação é crucial para garantir que as evidências tenham influência e incidência, especialmente em um contexto em que há disseminação ampla de desinformação.
Nesta conversa, fizemos três perguntas sobre sua experiência como intermediador do conhecimento na interface ciência-política, como o uso de evidências mudou após a pandemia do COVID e possíveis oportunidades para avançar no uso de evidências na América Latina e no Caribe. Boa leitura !
Hub LAC: Que experiência do Chile foi importante para você trazer para o Canadá?
Cristián Mansilla: Acho que nos acostumamos com um aprendizado Norte-Sul. Mas o Sul global tem muito a contribuir para isso. No Chile , passamos décadas tentando promover esse tema [PIE] como país, pelo menos no setor da saúde. É algo de que devemos nos orgulhar e que, sem dúvida, muitos países do Norte global poderiam levar como aprendizado e experiência a seguir.
HL: Como foi a experiência de formar a Unidade de Evidências do Ministério da Saúde (MINSAL)? Você acha que pode ser replicado em outros países ou é muito particular da cultura institucional do Chile?
CM: Estou convencido de que isso existe em muitas partes do mundo, existem muitos mecanismos para aproximar o trabalho de pesquisa da tomada de decisão. O principal motor e a forma mais eficaz desse processo é o papel dos intermediários. Que é o papel desta unidade do MINSAL. [A Unidade] tem o papel de ser uma ponte entre o que está sendo produzido em pesquisa em nível global e em nível local, com as necessidades de evidência dos tomadores de decisão em um dado momento. Essa ponte, essa mediação, é o papel fundamental que facilita o uso virtuoso da evidência.
Acho que esse é o grande desafio de todas as pessoas que fazem intermediação. Todas as pessoas que fazem algum trabalho específico de fornecer conhecimento para tomar decisões estão hoje em uma posição crítica para compreender como enfrentaremos a próxima crise. Como lidaremos com esta conjuntura crítica que o COVID nos deixa para nos fortalecermos.
HL: Como você acha que mudou o uso de evidências depois da pandemia?
CM: Estou otimista com isso. Acho que o termo “usar evidências para tomar decisões”, antes da pandemia, não era algo que todos nós dominamos ou que estivesse no nosso vocabulário, na nossa conversa diária. Durante a pandemia e depois da fase mais aguda, ele se democratizou um pouco.
Os cidadãos [agora] têm alguma opinião sobre o quanto os tomadores de decisão estão usando conhecimento, se estão ouvindo a ciência para tomar decisões. Isso não acontecia antes. Agora tem prestação de contas (…) Acho que hoje estamos em um momento crítico [critical juncture]. Podemos aproveitá-lo ou não. Podemos evitar que a próxima pandemia ou a próxima crise seja como a que acabou de acontecer.
Entrevista com Jorge Barreto
Conversamos com o Professor Jorge Barreto, que teve uma participação fundamental na concepção do HubLAC e atualmente compõe o nosso Conselho de Especialistas.
Jorge Barreto é pesquisador da Fiocruz Brasília há 8 anos. Antes, coordenou a Gestão do Conhecimento do Departamento de Ciência e Tecnologia do Ministério da Saúde e foi Secretário de Saúde em Piri-Piri/Piauí, onde possivelmente foi criado o primeiro núcleo de evidência do mundo em nível local. Paralelamente, ele exerce as funções de professor e pesquisador em universidades.
Nessa nossa primeira conversa, fizemos duas perguntas ao Jorge Barreto e apresentamos a seguir alguns dos principais pontos das suas respostas. A entrevista completa, com 32 minutos, pode ser assistida aqui. Boa leitura e audição!
Hub LAC: Por que as PIE são importantes e como podem afetar as pessoas em nossa região? Qual é a importância de conscientizar e mobilizar em torno das PIE?
Jorge Barreto: As PIE são um processo sistemático que ajuda que a tomada de decisão seja mais inclusiva quando se reduz a assimetria de informação, a qual atrapalha a comunicação entre os três eixos em torno da discussão: os que sofrem o problema, os que causam o problema e os que enfrentam o problema. Esses processos melhoram o exercício da cidadania, melhoram a democracia no sentido prático, porque processos participativos levam a decisões mais coerentes e mais capazes de serem implementadas e produzirem bons resultados.
Por isso as PIE são importantes porque melhoram o processo de tomada de decisão e acima de tudo os resultados das políticas (…), mas isso é um processo e como a nossa institucionalidade ainda é muito frágil temos sempre que recomeçar o trabalho, o que é bastante comum nesta área.
HL: Como você vê o impulso atual para a construção de redes na ALC em torno das PIE e qual o papel do Hub LAC?
JB: Todos os países do mundo hoje têm presença nesta discussão e na América Latina e no Caribe isto não é diferente. Tem um campo diversificado de atores. A saúde liderou o processo, mas já se vê a discussão em várias áreas, como na educação, fortemente, na segurança pública, na assistência social… Se hoje ainda não há formalmente uma rede constituída, temos todas as condições para isto e é aí que o Hub entra, no sentido de catalisar oportunidades e não deve e não pode ser a única iniciativa.
Hoje, na América Latina e o Caribe, o ambiente está favorável como nunca e isto faz parte do processo de amadurecimento da discussão social sobre evidências. O Hub LAC tende a ser inovador por ser uma rede de redes e por ter a visão setorial de áreas que compartilham determinantes, uma conjuntura imersa em uma mesma realidade, e isso nos leva ao potencial de aprendizagem mútua entre esses setores, proporcionada pelo Hub.
Trabalhando junto se aprende muito mais e mais rápido e estas duas questões colocam o Hub em uma posição privilegiada globalmente porque hoje ainda não existe uma experiência similar e este movimento de intercâmbio é quase uma consequência do que aconteceu até aqui e preparou o caminho para este tipo de rede.
O Hub LAC é este fenômeno que tem uma liderança pioneira, que não é concentrada, há uma distribuição da horizontalidade que favorece que mais pessoas se juntem a ele e ela se nutre e vai crescendo em tamanho e maturidade.
Entrevista com Kershelle Barker
Ouvindo os parceiros: Caribbean Centre for Health Systems Research and Development (CCHSRD)
Apresentação
O Caribbean Centre for Health Systems Research and Development (CCHSRD) é um Centro de Pesquisa da Universidade das Índias Ocidentais, localizado em St. Augustine, Trinidad e Tobago (T&T). O Centro foi estabelecido em 2018 para realizar um programa de trabalho em Pesquisa de Políticas e Sistemas de Saúde (HPSR), com o objetivo de abordar os urgentes problemas de políticas e sistemas enfrentados pelos tomadores de decisões na região do Caribe. O Centro se envolve em diversas atividades, com quatro funções principais: condução de pesquisas, tradução do conhecimento, treinamento e desenvolvimento de recursos humanos em saúde, e engajamento cidadão. Para esta publicação, entrevistamos Kershelle Barker, Pesquisadora Júnior em Sínteses de Evidências no CCHSRD.
1. Hub LAC: Conte-nos um pouco sobre o Caribbean Centre for Health Systems Research and Development e suas áreas de pesquisa focadas em formulação de Políticas Informadas por Evidências.
K.B: Com a missão de gerar e facilitar o uso de evidências de pesquisa para fortalecer os sistemas de saúde e os processos de formulação de políticas, grande parte de nosso trabalho se concentra em desenvolver a capacidade individual e institucional na formulação de Políticas Informadas por Evidências (PIE). Para esse fim, o CCHSRD conduziu Avaliações de Necessidades com os Ministérios da Saúde; Trabalho; Planejamento e Desenvolvimento; Desenvolvimento Social e Serviços Familiares; e Esporte e Desenvolvimento Comunitário em Trinidad e Tobago, para compreender seus processos de formulação de políticas, o uso de evidências e suas necessidades de treinamento em PIE.
Posteriormente, organizamos exercícios de definição de prioridades e workshops para desenvolver a capacidade em PIE, além de fornecer orientação e mentoria para funcionários selecionados como parte de dois grandes projetos – o programa de Mentoria do Centro de Conhecimento para Política do WHO Building Institutional Capacity for HPSR and Delivery Science e o projeto Partnership for Evidence and Equity in Responsive Social Systems (PEERSS).
Além disso, em 2020, o CCHSRD lançou com sucesso o seu Programa de Treinamento de Bolsas de Estudo “Evidence to Policy”, com o objetivo de promover a formulação de políticas e práticas baseadas em evidências, desenvolvendo a capacidade tanto dos formuladores de políticas (para utilizar evidências) quanto dos pesquisadores (para apoiar o processo de formulação de políticas).
O Centro produziu/co-produziu diversos produtos de tradução de conhecimento para informar ações políticas e programáticas multissetoriais. Isso inclui seis (6) Resumos de Evidências para Políticas e quatro (4) Resumos de Resposta Rápida sobre prioridades em saúde (recursos humanos, serviços de saúde sexual e reprodutiva, saúde mental e prestação de serviços) e em outros setores sociais (trabalho, educação, assistência social e desenvolvimento comunitário). Também organizamos uma reunião de disseminação de interessados e duas mesas-redondas com partes interessadas, e estamos engajados em atividades de acompanhamento e advocacia para incentivar a adoção das evidências.
2. Hub LAC: Que esforços regionais específicos o CCHSRD empreendeu para melhorar a tomada de decisões no contexto do Caribe? Poderia dar alguns breves exemplos para ilustrar?
K.B: A segunda turma do Programa de Treinamento de Bolsas de Estudo “Evidence to Policy” do CCHSRD foi aberta para tomadores de decisão no Caribe. Um bolsista da Guiana concluiu com êxito o programa, e foi produzido um Resumo de Evidências para Políticas com o objetivo de melhorar o acesso, a qualidade e a equidade na prestação de serviços de saúde em Guiana. Esse Resumo continha evidências locais sobre o problema, bem como elementos de políticas propostos para abordar a questão, embasados nas melhores evidências disponíveis. Embora o programa de bolsas de estudo tenha sido encerrado desde então, temos a intenção de continuar envolvendo-se com as partes interessadas em Guiana, para fornecer treinamento e capacitação em habilidades e processos de formulação de políticas baseadas em evidências.
Em 2022, o CCHSRD colaborou com o Hub de Evidências da América Latina e Caribe (Hub LAC) para sediar um workshop de aprendizado virtual. Os objetivos foram identificar as necessidades locais e regionais de formulação de políticas baseadas em evidências; conectar as principais partes interessadas de três países caribenhos (Trinidad e Tobago, Barbados e Jamaica); e gerar conhecimento sobre a formulação de políticas baseadas em evidências na região. Este workshop proporcionou insights valiosos sobre as barreiras e facilitadores comuns para a formulação de políticas baseadas em evidências no Caribe, bem como os fatores necessários para construir um forte ecossistema de evidências.
Além disso, o CCHSRD abriga a Comunidade de Prática para Pesquisa em Política e Sistemas de Saúde (CoP4HPSR) do Caribe, que é uma rede de 135 pesquisadores, profissionais de saúde, formuladores de políticas e outras partes interessadas de 14 países, comprometidos em fortalecer a capacidade de pesquisa em política e sistemas de saúde na região do Caribe. Através do compartilhamento de informações e do diálogo frequente sobre tópicos relacionados à pesquisa em política e sistemas de saúde, pretendemos continuar fortalecendo a compreensão dos tomadores de decisão e pesquisadores sobre o papel crucial da evidência na formulação de políticas e tomadas de decisões no Caribe.
3. Hub LAC: Na sua opinião, que contribuições significativas um Hub colaborativo regional pode fazer para atender às necessidades de tradução de conhecimento em um ecossistema de formulação de Políticas Informadas por Evidências em nossa região da América Latina e Caribe (LAC)?
K.B: Um Hub colaborativo regional é importante para promover uma compreensão compartilhada e o comprometimento com a utilização de evidências na tomada de decisões na região da América Latina e Caribe (LAC). Desafios comuns que enfrentamos regularmente, os quais dificultam esse esforço, incluem uma desconexão entre os resultados de pesquisas e as necessidades dos formuladores de políticas; e uma falta de dados e evidências contextualizadas para informar políticas, programas ou intervenções nos países.
Ter um órgão regional dedicado a preencher essa lacuna e gerar produtos e serviços de tradução de conhecimento adaptados à região da LAC resultaria em fornecer aos formuladores de políticas/tomadores de decisões evidências oportunas e relevantes para informar ações que têm mais probabilidade de: (i) ser viáveis e fazer um melhor uso dos recursos já limitados; (ii) superar potenciais barreiras específicas do contexto para a implementação; e, portanto, (iii) alcançar impactos positivos, como a melhoria da saúde e outros resultados da população.
A colaboração em nível regional também pode ajudar a aumentar o envolvimento dos tomadores de decisão no processo de pesquisa/evidência-política; e fortalecer as relações entre os países, para unir recursos e esforços a fim de abordar prioridades regionais de saúde e sociais.
Entrevista com Janessa Oliveira
Ouvindo os parceiros: Women and Global Health
Apresentação
Iniciando sua jornada em 2015 como uma Organização sem Fins Lucrativos, hoje a Women in Global Health representa um movimento global de atuação e liderança para a promoção da equidade de gênero na saúde. Atualmente, a organização conta com 47 capítulos em 43 países, cerca de 5.500 membros e 100.000 apoiadores em mais de 100 países, estabelecendo uma ampla rede de aliados em prol do fortalecimento da liderança igualitária de gênero na saúde global. Para este boletim, conversamos com Janessa Oliveira, doutora em Saúde Pública, que atualmente integra a coordenação do capítulo brasileiro da Women in Global Health.
Hub LAC: A WGH possui ações tanto em advocacy, como enquanto plataforma para diferentes iniciativas e parcerias. Nesse sentido, você poderia nos dar um panorama concreto de iniciativas que vocês desenvolvem?
J.O: A WGH vem atuando há oito anos através de diversas iniciativas para promover a igualdade de gênero na área da saúde. A área de advocacy e articulação com organizações com influência em cada território se mostrou uma parte crucial da nossa atuação. Dessa forma, os capítulos regionais e nacionais são estimulados a buscar alianças e contatos para implementar ações nessas vertentes que possam gerar mudanças a nível local. Além disso, a organização promove eventos que mostram experiências bem-sucedidas em outros países, para que outros capítulos possam se inspirar. Ademais, a WGH compreende a relevância em participar de eventos e conferências a nível global, como forma de incentivar a representatividade das mulheres nestes espaços, participando dos debates para promover a redução das desigualdades de gênero na área da saúde.
2. Quais são as principais evidências que apoiam a compreensão de vocês sobre a natureza e a magnitude dos desafios na igualdade de gênero na saúde?
J.O: Atualmente nos apoiamos em dados secundários fornecidos principalmente pelo CNES – Cadastro Nacional dos Estabelecimentos de Saúde, e estamos trabalhando em estabelecer alianças locais para coletar e compreender melhor o perfil demográfico das profissionais de saúde no Brasil. Para investigar a desigualdade de remuneração, estamos em contato com os conselhos profissionais para obter dados assertivos. Para gerar conhecimento sobre questões relacionadas a violências, o capítulo brasileiro investirá na busca de dados com os conselhos profissionais e na aplicação de um inquérito. Para maximizar a adesão a esta pesquisa, visto que é um tema sensível, estamos formando alianças para disseminar o questionário em todo o Brasil e obter uma amostra mais representativa.
Hub LAC: 3. A WGH hoje conta com uma ampla rede global, estendida pelos cinco continentes. Como são engendradas estas iniciativas, considerando as particularidades de cada região ou mesmo entre os países?
J.O: A Women in Global Health conta com uma gestão que busca criar mecanismos de colaboração regional e global entre os capítulos. Para tal, existem diversos Hubs regionais onde os capítulos podem colaborar e alinhar prioridades, organizar atividades conjuntas, entre outros. Também existem reuniões globais mensais em que os capítulos engajam, compartilham suas atualizações e discutem diversos temas atuais no escopo do advocacy para a saúde global.
Para promover a troca de experiências e ideias, a WGH global também busca organizar eventos e atividades com o intuito de mostrar como diferentes temas se dão nas diversas regiões. Um exemplo desse tipo de atividade foi a organização de quatro Assembléias regionais (Townhalls) sobre o tema de Exploração, abuso e assédio sexual (SEAH) na área da saúde, para o qual foram convidadas representações de governos, ONGs e ativistas para discutir questões propostas pela WGH sobre assédio e violência na saúde global.
Durante esses eventos (que foram realizados para as regiões da África Oriental e Meridional, Ásia, América Latina e Caribe, África Francófona), iniciativas interessantes foram apresentadas, ampliando a troca de ideias e experiências entre representantes desses setores em diversos países. O capítulo brasileiro foi um dos co-sponsors do evento para a região das Américas e o Caribe. Vejam aqui os resultados dos eventos.
Outra iniciativa importante na qual estamos trabalhando, está mais alinhada com a nova proposta da WGH, lançada no final do ano passado, que tem foco na Cobertura Universal de Saúde. Recebemos financiamento para projetos nessa linha e nossa primeira iniciativa será trabalhar com podcasts. Acreditamos que os podcasts são uma excelente ferramenta para disseminar conteúdos de qualidade em áreas remotas, onde a cobertura de internet é limitada, como é o caso da região amazônica. Queremos difundir conteúdos que promovam a liderança feminina e melhorem a qualidade da assistência à saúde nessas áreas.